As verdades sobre a Prevenção do Cancro – Parte 1

Todos nós temos um potencial cancro dentro de nós. Chamam-se microtumores. À semelhança de todos os seres vivos, o nosso organismo produz constantemente células defeituosas que, se não forem detectadas e controladas, vão evoluir para tumores.

Felizmente, o nosso sistema imunitário – se devidamente mobilizado – pode ajudar a travar e a prevenir o desenvolvimento deste tipo de doença. Apenas com a mudança de alguns hábitos no nosso estilo de vida (melhor alimentação e melhor exercício físico – disse melhor, não necessariamente mais), é possível prevenir o cancro e grande parte das doenças. Muita gente não acredita e não é consciente da verdadeira importância do nosso estilo de vida na prevenção ou no desenvolvimento de doenças como o cancro.

Eu tive um cancro há alguns anos atrás (duas vezes!) e se soubesse aquilo que sei hoje, de certeza que me teria tratado melhor naquilo que depende de mim. Refiro-me, por exemplo, à alimentação. Todos nós podemos melhorar a nossa alimentação. Na comida podemos encontrar moléculas que “falam” com os nossos genes pelo que tudo aquilo que metemos na boca vai influenciar o nosso DNA.

Por exemplo, se comemos mais de 500 calorias por dia de junk food (entenda-se comida não nutritiva ou em linguagem prosaica: lixo), isso representa 182.500 calorias num ano, o que pode significar um aumento de mais de 20 quilos num ano.

A decisão mais poderosa que tomamos todos os dias é escolher o que metemos na boca. A alimentação deve ser vista como o nosso bem mais precioso e aquele em que mais temos que investir, quer em termos de tempo, quer em termos financeiros. Sim, vai custar mais dinheiro e é capaz de dar mais trabalho, mas se não começarmos a comer melhor ou a pensar desta forma, vamos pagar o preço mais tarde ou mais cedo com doenças, medicamentos, consultas, cirurgias, etc. É verdade que nem todos têm escolha mas acredito que a maioria daqueles que estão a ler isto, terão.

O seguinte filme Food Matters é OBRIGATÓRIO e podem encontrá-lo aqui gratuito e dividido em várias partes. Se não puderem ver agora, tomem nota e vejam assim que possível. A mensagem que aqui passa é fundamental para perceber que existem formas muito simples de melhorar a nossa qualidade de vida e a dos nossos amigos, sem recorrer às famigeradas drogas.

Alguns Estudos – Genes vs. Estilo de Vida

Muita gente está convencida de que o desenvolvimento de cancro está principalmente ligado à nossa composição genética e não ao nosso estilo de vida. Na Dinamarca, onde existe um registo genético pormenorizado das origens de cada um, os investigadores descobriram os pais biológicos de mais de mil crianças adoptadas à nascença. A conclusão a que chegaram, publicada no prestigiado New England Journal of Medicine, obriga-nos a alterar todas as nossas suposições em relação ao cancro. Descobriram que os genes de pais biológicos que morreram de cancro antes dos 50 anos não tinham qualquer influência no risco de um filho adoptado desenvolver a doença. Por outro lado, a morte por cancro antes dos 50 anos de um pai adoptivo (que transmite hábitos, não genes) aumentava cinco vezes a taxa de mortalidade por cancro nos filhos adoptivos. Este estudo mostra que o estilo de vida tem uma influência fundamental na vulnerabilidade ao cancro mas todas as investigações são unânimes: os factores genéticos contribuem, no máximo, em 15% das mortes por cancro.

Em 2005, o Dr. Dean Ornish, publicou os resultados de um estudo oncológico sem precedentes. Noventa e três homens com cancro da próstata em fase inicial, optaram, sob a supervisão do seu oncologista, por não serem operados, mas manter o tumor sob controlo. Para isto, mediu-se o nível de PSA no sangue (um antigénio específico da próstata e que é estimulado pelo tumor) a intervalos regulares. Um aumento de PSA indica que as células cancerosas estão a multiplicar-se e que o tumor está a crescer.

Ao recusarem qualquer tipo de tratamento médico convencional durante este período de observação, estes homens tornaram possível a avaliação das vantagens das abordagens naturais. Foram formados dois grupos de pacientes. O grupo de controlo manteve-se apenas com observação, com medições regulares de PSA. Para o outro grupo, criou-se um programa completo de saúde física e mental, ou seja, durante um ano estes homens seguiram uma dieta vegetariana com suplementos (vitaminas antioxidantes E e C, selénio e 1 grama de ómega-3 por dia), praticaram exercício físico (30 minutos de caminhadas, 6 dias por semana), gestão de stress (ioga, exercícios respiratórios, relaxação) e reuniram-se uma hora por semana com um grupo de apoio e com outros pacientes inseridos no mesmo programa.

Dos 49 pacientes que nada tinham alterado no seu estilo de vida e que haviam apenas confiado num controlo regular da doença, 6 assistiram ao agravamento da doença e tiveram de ser submetidos à ablação (extração) da próstata, seguida de quimioterapia e radioterapia. Em contrapartida, nenhum dos 41 pacientes que haviam seguido o programa de saúde física e mental foi obrigado a recorrer a estes tratamentos. No primeiro grupo, o nível de PSA aumentou em média 6% (sem incluir aqueles que tiveram de desistir devido ao agravamento da doença) e no segundo grupo (os tais que mudaram o estilo de vida), a PSA diminuiu em média 4% indicando uma regressão dos tumores na maioria dos pacientes.

Contudo, o mais impressionante foi aquilo que aconteceu no organismo dos homens que mudaram de estilo de vida. O seu sangue era sete vezes mais capaz de inibir o crescimento de células cancerosas do que o sangue dos homens do primeiro grupo. Ou seja, os homens que mudaram de estilo de vida tornaram o seu sangue mais activo contra as células cancerosas.

Com a finalidade de compreender os mecanismos moleculares que estão na origem destes fenómenos, o Dr. Ornish  decidiu investigar a forma como as alterações de comportamentos influenciavam a expressão dos genes das células prostáticas. Chegou à conclusão que o seu programa modificou mais de 500 genes na próstata estimulando aqueles que têm um efeito preventivo e inibindo aqueles que favorecem o desenvolvimento da doença.

Em 2009, dois grupos de investigação independentes, um no Quebeque e outro na Califórnia, abalaram por completo a nossa compreensão das causas genéticas do cancro da mama e da próstata, e a ideia de que os nossos genes condicionam o risco de vir a morrer de cancro. A equipa da Universidade de Montreal, chefiada pelo Dr. Parviz Ghadirian, estudou as mulheres portadoras dos genes BRCA-1 e BRCA-2 – genes que aterrorizam tantas mulheres, dado que o risco das portadoras virem a desenvolver cancro da mama é 80%. Nas suas investigações descobriu que quanto mais fruta e legumes as mulheres geneticamente “em risco” comiam, menor era o risco de desenvolverem cancro. Nas mulheres que consumiam 27 peças de fruta e legumes diferentes por semana (a variedade era importante), o risco tinha diminuído em 73%.

Na Universidade de São Francisco, a equipa do Professor John Witte fez uma descoberta semelhante para o cancro da próstata. Alguns genes desencadeiam uma sensibilidade extrema à inflamação e estimulam a tranformação de microtumores indolentes da próstata em cancros agressivos e metastáticos. Porém, quando os homens portadores desses genes consumiam peixe rico em ómega-3 pelo menos duas vezes por semana, os seus genes perigosos mantinham-se sob controlo. O risco do cancro vir a tornar-se agressivo era cinco vezes menor do que nos homens que não comiam peixe gordo.

Estas recentes descobertas apoiam a noção de que os “genes do cancro” talvez não sejam tão perigosos se não forem despoletados pelo nosso estilo de vida pouco saudável.

Na parte 2, vamos identificar os pontos fracos e fortes do cancro, os seus mecanismos de desenvolvimento e como podemos actuar para prevenir e até travar esta doença. Fiquem atentos.

Até breve.

Pedro Correia

Referências

David Servan-Schreiber (2012). Anti Cancro, uma nova maneira de viver.